A carne descongelando na pia, a roupa na máquina de lavar, o esmalte sobre o sofá. Em vez de cenas de uma manhã de domingo comum, detalhes de uma cena de crime tão misterioso quanto cruel. Vista molhando as plantas pouco depois das 10h de domingo, numa área externa do apartamento térreo onde morava, na Penha, Marlene Pereira de Oliveira, de 51 anos, foi encontrada cerca de uma hora e meia depois, dentro do apartamento, com pelo menos 18 facadas, pregos nas pernas e o corpo em chamas. Levada para um hospital, a cuidadora de idosos não resistiu. A polícia, bem como amigos e parentes, ainda não tem pistas do que motivou a morte brutal. As investigações estão a cargo da Divisão de Homicídios (DH), que ainda não havia recebido o inquérito aberto na 22ª DP (Penha) até a tarde desta segunda-feira.
Na Paróquia Bom Jesus da Penha, frequentada por Marlene há mais de duas décadas, e onde há 14 anos ela exercia a função de ministra de eucaristia, o sentimento é de incredulidade. Conhecida pela religiosidade e por gestos solidários — há poucos meses, acompanhou gratuitamente por semanas uma idosa da igreja que se acidentou —, ela visitava com regularidade os seis templos mantidos pela paróquia em comunidades do vizinho Complexo da Penha, na Zona Norte do Rio.
— Temos trânsito em todos os organismos. E aqui é área de risco, sempre escutamos tiros — diz o padre José Everaldo Germano, de 56 anos, antes de descrever Marlene, amiga de mais de uma década, como uma “evangelizadora em várias dimensões”: — A reação da comunidade é de espanto e impotência.
Sem parentes no Brasil, Marlene não namorava há anos e tampouco tinha filhos. Segundo todos os relatos, também não cultivava inimigos.
— A família dela era a igreja — afirma uma amiga de infância.
Único documento que restou, já que os outros pegaram fogo no ataque do assassino, o passaporte de Marlene — carimbado duas vezes, em 2015 e em 2016, em visitas à única irmã nos Estados Unidos — foi utilizado na ida do corpo para o Instituto Médico-Legal, já na tarde de ontem. Ainda não há data do enterro.
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