quarta-feira, 6 de julho de 2016

Papa aceitou renúncia de Dom Aldo após acusação de ser gay.


A agência de notícias italiana Ansa publicou à renúncia ao governo pastoral da arquidiocese da Paraíba apresentada pelo arcebispo Dom Aldo Di Cillo Pagotto, ocorrida nesta quarta-feira (5). Segundo a matéria, a desistência de Dom Aldo teria ocorrido após o Vaticano tomar ciência de acusações contra ele sobre relações homossexuais e de ignorar casos de pedofilia dentro da igreja católica.

Confira a matéria:

Papa aceita saída de arcebispo brasileiro acusado de ser gay

Dom Aldo Di Cillo Pagotto renunciou à
arquidiocese da Paraíba, Francisco aceitou a renúncia apresentada pelo arcebispo dom Aldo Di Cillo

(ANSA) – O papa Francisco aceitou nesta quarta-feira (6) a renúncia ao governo pastoral da arquidiocese da Paraíba apresentada pelo arcebispo dom Aldo Di Cillo Pagotto, acusado de manter relações homossexuais e de ignorar casos de pedofilia.

Por meio de um processo canônico, a arquidiocese havia sofrido no ano passado uma intervenção da Santa Sé, com o envio do bispo de Garanhuns, Fernando Guimarães, como “visitante apostólico”. Na ocasião, Pagotto, de 66 anos, foi proibido de ordenar novos diáconos e sacerdotes e de receber seminaristas até que o Vaticano concluísse as investigações.

O inquérito nasceu após denúncias de que o arcebispo da Paraíba havia acolhido padres e seminaristas expulsos de outras dioceses. Além disso, ele teria se recusado a discutir casos de pedofilia. Também em 2015, uma carta escrita por uma mulher o acusou de manter uma relação afetiva com um jovem de 18 anos e de realizar “encontros íntimos” na sede da arquidiocese.

Mais tarde, a autora da correspondência, Mariana José, disse que não conhecia os personagens citados no texto, embora admitisse que a assinatura no documento era sua. Já o arcebispo sempre negou todas as acusações.

A renúncia de Pagotto foi aceita por Francisco com base no artigo 2 do cânone 401 do Código de Direito Canônico, ou seja, por “grave causa”.

RENÚNCIA

Dom Aldo di Cillo Pagotto enviou ao Vaticano uma carta com pedido de renúncia por motivo de saúde. O pedido foi acolhido pelo papa Francisco.

Em comunicado, a Congregação para os bispos informou que, “para atender ao governo da Igreja Metropolitana da Paraíba, vacante pela renúncia do último arcebispo, o Sumo Pontífice, pela Divina Providência, Papa Francisco, através de Decreto da Congregação para os Bispos, a partir de hoje e até que o arcebispo, que deve ser eleito, tome posse canônica, nomeou e constituiu administrador apostólico da Arquidiocese da Paraíba o Exmo. Dom Genival Saraiva de França, bispo emérito de Palmares (PE), e lhe atribuiu as faculdades e as funções que competem aos administradores diocesanos, à norma do direito”.

O Decreto foi datado neste dia 6 de julho de 2016, em Roma, no Palácio da Congregação para os Bispos e assinado pelo prefeito da Congregação, Marcus, Card. Ouellet, e pelo secretário da mesma Congregação, Ilson de Jesus Montanari.

Leia abaixo a carta de Dom Aldo Pagotto:

Carta aberta aos Irmãos Bispos do Regional NE 2 da CNBB, ao Clero e ao Povo de Deus da Igreja Particular da Paraíba.

Invocando o santo nome de Deus Uno e Trino, coloco-me sob a proteção da Imaculada Virgem Maria e, em espírito de oração, discernimento e obediência, apresentei ao Santo Padre, o Papa Francisco, o meu pedido de renúncia ao governo pastoral da Arquidiocese da Paraíba. Cito sumariamente alguns fatores que me obrigam a tal atitude.

1. Ao longo de 12 anos, preposto ao governo pastoral desta Arquidiocese, tentei desenvolver a missão evangelizadora e pastoral que o Senhor me confiou junto ao Clero, aos cristãos fieis, às autoridades constitucionais e às lideranças institucionais, seguindo o lema: “Há um só Corpo e um só Espírito” (Ef 4, 4).

– Minha intenção sempre se voltou à promoção da comunhão na caridade, tentando participar de forma proativa na edificação da Igreja fraterna e solidária, e da construção da sociedade com inclusão e justiça social.

– Tentei doar o melhor de mim mesmo, não obstante as sérias limitações de saúde, ademais das repercussões no equilíbrio emocional, causadas pela constante necessidade de superar conflitos inevitáveis, advindos de reações ao meu modo de ser e de agir.

2. Tomei decisões enérgicas e inadiáveis em relação à reorganização da administração, finanças e recuperação do patrimônio da Arquidiocese, sempre em sintonia com o nosso ecônomo. Embora tenha sido exitoso, desinstalei e desagradei muita gente, por razões facilmente presumíveis.

– Acolhi padres e seminaristas, no intuito de lhes oferecer novas chances na vida. Entre outros, alguns egressos, posteriormente suspeitos de cometer graves defecções, contrárias à idoneidade exigida no sagrado ministério. Cometi erros por confiar demais, numa ingênua misericórdia.

– Tomei posições assertivas diante de políticas públicas estruturais em vista do desenvolvimento integral de nossa gente e de nossa terra. Evitei “ficar em cima de muro”. Foi inevitável acolher reações e interpretações diferentes, independente de minha reta intenção de não me imiscuir na esfera político-partidária, e jamais almejar algum poder de ordem temporal.

3. Não tardaram retaliações internas e externas, ademais da instauração de um clima de desestabilização urdida por grupos de pressão, incluindo os que se denominaram “padres anônimos”, escudados no sigilo da fonte de informações, obtendo ampla cobertura num jornal. Matérias sobre a vida da Igreja da Paraíba, descritas em forma unilateral, distorcida, provocatória, foram periodicamente veiculadas, seguidas de comentários arbitrários por várias redes sociais.

– A exemplo, um blog divulgou carta difamatória, envolvendo o arcebispo e vários sacerdotes, arbitrariamente expostos ao escárnio público. As redes sociais encarregaram-se de espalhar comentários peregrinos e duvidosos. A presumida autora da carta responde em foro criminal.

4. A ideia obsessiva espalhada intenciona afirmar à fina força que o clero esteja dividido, que o governo da Arquidiocese esteja desestabilizado, e que, nesse contexto, o arcebispo perdeu a capacidade de coordenação e, por fim, não vale à pena ordenar padres numa igreja dividida.

5. Esse sucinto relato sobre fatos amplia-se em relatórios que eu enviei à Nunciatura Apostólica no Brasil e às demais instâncias da Santa Sé, como pedido de compreensão e ajuda, porquanto eu não tenha nada a esconder. Sabe-se que outro dossiê foi enviado às mesmas instâncias, por parte de membros do Clero e de leigos.

6. Por tanto tumulto, embora eu esteja sofrendo muito, permito-me afirmar que conservo a minha consciência em paz. Sempre estarei disposto a corrigir rumos, a reorientar passos, a confirmar êxitos alcançados, contando com a graça de Deus e também com a efetiva presença de bons padres, religiosos presbíteros e de bons leigos e leigas, qualificados como forças vivas de nossa amada Igreja Particular da Paraíba.

7. Auto-elogio e passividade não fazem parte do meu feitio. Deus sabe o que faz e o tempo é juiz da história. Minha nonna (avó) dizia: “quando alguém te caluniar e tentar destruir tua vida, tua resposta seja o silêncio e mais trabalho, não se rebaixando ao nível mesquinho do espírito da treva”.

8. Passo por duras provações, sentindo a frustração de alguns sonhos que, entanto, entrego nas mãos de Deus. Que a minha vida seja para a maior glória de Deus, não para a busca de mim mesmo e de outros interesses que não provenham do Senhor. Comigo sofrem muitas pessoas e comunidades. Todos esperam em Deus que tem saídas inesperadas para os impasses criados. Não há mal do qual Deus não tire um bem maior!

– Penso que eu não tenha o direito de provocar ou de prolongar sofrimentos ainda maiores, especialmente aos jovens que esperam servir a Deus na vida sacerdotal nesta Igreja da Paraíba que tanto nós todos amamos.

9. Creio que o melhor, pelo momento, para a Igreja Universal e para a Igreja Particular da Paraíba, seja a minha renúncia. Ante o desgaste enfrentado, sinto-me no dever de evitar comprometer a Unidade na Caridade, a expressão característica e essencial da Igreja de Jesus Cristo.

– Sinto-me fortalecido na fé, cultivando a espiritualidade eucarística e marial. O Senhor é meu Pastor. Ele não me faltará (Sl 23). Ele me dará forças, sustentar-me-á ao longo das provações, impulsionando-me a fazer o dom de mim mesmo para a continuidade da missão que Ele ainda me confia. Há muitos espaços e oportunidades. Estou disposto a buscá-los, pedindo a Deus que me mostre o lugar onde eu possa ser útil, a começar pela minha Congregação do Santíssimo Sacramento, que eu tanto amo.

10. Deixo registrado o meu pedido sincero de perdão às pessoas a quem eu tenha feito sofrer, voluntária ou involuntariamente. Cometi erros, acertei passos, estou disposto a caminhar com quem queira caminhar, construindo dias melhores para todos, superando o apego a cargos, títulos, privilégios.

– Peço perdão a Deus e perdôo os que me fizeram sofrer muito. Não há nada de oculto que um dia não venha a ser revelado e proclamado pelos tetos. Nem devemos temer quem mata o corpo, mas não o espírito (Lc 12, 1-4).

11. Passo, em obediência, o comando da Arquidiocese para um Irmão mais jovem, com forças, coragem e capacidade para tomar rumos acertados, mostrados pelo Pai de amor e misericórdia, o Senhor da vida!

– Sigo o exemplo de SS. o Papa Bento XVI, dando o espaço àquele que Deus enviar para o bem de sua Igreja.

12. Sirvo-me, pois, da 2ª Carta de Paulo aos Coríntios (2 Cor. 4, 1 ss) para expressar meus sentimentos e auspícios: “Detentores desse ministério, nós não perdemos a coragem. Dissemos não aos procedimentos secretos e vergonhosos. Conduzimo-nos sem duplicidade e não falsificamos a Palavra de Deus” (…) “Não é a nós mesmos, mas a Jesus Cristo Senhor que nós proclamamos. Mas este tesouro nós o guardamos em vasos de argila, para que o poder incomparável seja de Deus e não nosso. Pressionados de todos os lados, não somos esmagados; em impasses, nós conseguimos passar; perseguidos, mas não alcançados; prostrados por terra, mas não liquidados. Sem cessar trazemos em nosso corpo a agonia de Jesus, a fim de que a vida de Jesus seja manifestada em nosso corpo”.

13. Oro e desejo de todo o meu coração que a Igreja Particular da Paraíba prospere na ação evangelizadora e pastoral, seja fecunda na promoção da unidade interna e das obras de apostolado externo, abençoado por Nosso Senhor e por Nossa Senhora das Neves, nossa padroeira.

– Que cresça sempre mais em qualidade e em número de cristãos fiéis, que dêem testemunho do Evangelho de Jesus, pela palavra e pelos exemplos de vida, vivida na unidade e no amor. Em tudo, amar e servir, unidos a Nosso Senhor, qual ramos à videira, para que se produzam muitos frutos (cf. Jo 15, 1s).

– Deixo o território material da Paraíba. Espiritualmente, porém, a pequenina gigante, a Paraíba, nunca sairá do meu coração, agradecido pelo muito que aprendi com o espírito guerreiro, hospitaleiro e amoroso de nossa gente.

– Deixo a todos e todas, além de minha constante prece, um forte abraço, um beijo no coração e as saudades jamais saciadas, na esperança de quando em vez voltar para visitar as mil amizades sinceras e fraternas, a quem agradeço e a quem eu quero bem de verdade.


+ Aldo di Cillo Pagotto, sss
Arcebispo Emérito da Paraíba